SERRA DE MARACAJU - MEU EIXO DE MUNDO, MEU CASTELO INTERIOR, O MONTE
SINAI DO MEU SER.
Quando o avião pousa no solo de minha cidade, Campo Grande, sinto uma
emoção, um ar diferente, misto de éter e força. É como se houvesse mais
segurança, uma verdade profunda, um retorno ao princípio. Comentei isso com o
mestre Campestrini e ele ponderou: “ - Não é apenas uma sensação. É real. São os
fluídos da Serra de Maracaju.”
Essa serra, com sua cadeia de montanhas, picos e quebradas, divide o
sul de Mato Grosso em dois: a oeste, a capital e a leste, os campos de cerrado
e vacaria, o início do Pantanal. São rochas de basalto e arenito, antigos
derrames vulcânicos que escoaram pelas bacias dos rios, pelos verões úmidos e
chuvosos. Os europeus, em antigas balizas, pensavam tratar-se dos lagos e mares
de Xaraés.
Este ponto é meu eixo de mundo, meu castelo interior, o monte Sinai do
meu ser. Aqui sou guiada pelo Sol e pela Lua. Tenho os jardins de uma rainha,
cheio de antúrios e figueiras. Aqui sacrifiquei o meu Isaque: alguns sonhos e
cordeiros que se espalharam na bruma.
E por que “Maracaju”? Em guarani “maracaju” significa “chocalho
amarelo”. O chocalho na ponta da cauda da cascavel. A serpente balança os
guizos e anéis de pele, pronta para dar o bote, chiando, os losangos do corpo
inflando e desinflando de ira. O barulhinho pavoroso serve de alerta para os
que andam pelas trilhas da serra.
Almir Sater, numa linda canção, lembra de um velho índio que lhe
contou histórias de glórias e tragédias; que viu deuses descendo de estrelas,
antes da invasão dos portugueses, dos espanhóis, dos bandeirantes e mineiros.
Ele é menestrel que quer descobrir lendas e memórias, tocar e compor seus
próprios chamamés, traduzir os mistérios da Serra de Maracaju.
Muito antes de Sater, quem cantou as belezas da Serra de Maracaju foi
o precursor de nossa literatura: o Visconde de Taunay. Foram as contingências
da cruenta Guerra do Paraguai que deram à sensibilidade do escritor a
oportunidade de observar a vida, a paisagem e os costumes mato-grossenses. Das
anotações desse jovem tenente do imperador D. Pedro II, surgiram duas
obras-primas: Inocência, romance peregrino, situado na melhor ficção
regionalista de todos os tempos e
Retirada da Laguna, relato pungente sobre a bravura de homens numa
batalha desigual contra o inimigo implacável e a natureza hostil. Depois,
Otávio Gonçalves Gomes, poeta e historiador, escreveu Mato Grosso do Sul na
Obra de Taunay e contou sobre o momento em que Taunay, junto do rio Aquidauana,
numa ramificação da Serra de Maracaju, deparou-se com aquela paisagem grandiosa
e fantástica: os arcos naturais, as esculturas cinzeladas nos maciços.
Viu o sol batendo nos “píncaros e planos desnudados de vegetação, de
um colorido vermelho”, cheio de clarões e chispas de fogo. Descreve ainda, nas
matas fechadas, os festões de flores pelos declives, pelos aparados da serra,
embelezando os caminhos de anta e animais silvestres. O Morro Azul, atalaia do
rio Aquidauana, “cesto de gávea avistado de todos os lados”. E também a cortina
de árvores possantes, colossos de corpulências. As cascatinhas pelos córregos,
deslizando pelos penedos. Quanto deslumbramento.
Nosso chão já foi chamado de Estado de Maracaju. Esse foi o nome dado
à criação revolucionária dos que primeiro desejaram a divisão de Mato Grosso, a
independência e separação de Cuiabá. O Estado de Maracaju existiu de fato, sem
autorização da União, de 10 de julho a 2 de outubro de 32, durante a Revolução
Constitucionalista.
Teve como governador Vespasiano Barbosa Martins. O sul de Mato Grosso apoiou a causa paulista na pessoa do general Klinger. Com o fim da revolução e a vitória de Getúlio Vargas, o Estado de Maracaju foi dissolvido. Estava lançada a semente embrionária do Mato Grosso do Sul, que só nasceu oficialmente no dia 11 de outubro de 77. A loja maçônica que serviu como Palácio Maracaju, sede dos divisionistas, está ali, com suas colunas clássicas fincadas na rua Calógeras, carregadas de História.
Teve como governador Vespasiano Barbosa Martins. O sul de Mato Grosso apoiou a causa paulista na pessoa do general Klinger. Com o fim da revolução e a vitória de Getúlio Vargas, o Estado de Maracaju foi dissolvido. Estava lançada a semente embrionária do Mato Grosso do Sul, que só nasceu oficialmente no dia 11 de outubro de 77. A loja maçônica que serviu como Palácio Maracaju, sede dos divisionistas, está ali, com suas colunas clássicas fincadas na rua Calógeras, carregadas de História.
Percebi, aliviada, que o avião pousou no monte, no topo, onde há
conhecimento, revelações e saída para outro cosmos. Ouço a voz do velho mestre:
“ - São os fluídos da Serra de Maracaju”.
UM POUCO SOBRE A AUTORA DO TEXTO:
SERRA DE MARACAJU - MEU EIXO DE MUNDO, MEU CASTELO INTERIOR, O MONTE
SINAI DO MEU SER.
RAQUEL NAVEIRA
Raquel Naveira nasceu em Campo Grande, Mato Grosso do Sul. É formada
em Direito e Letras pela Universidade Católica Dom Bosco (UCDB/MS), onde
exerceu o magistério superior, desde 1987 até 2006, quando se aposentou.
Doutora em Língua e Literatura Francesas pela Universidade de Nancy, França.
Mestre em Comunicação e Letras pela Universidade Presbiteriana Mackenzie (SP).
Apresentadora do programa literário “Prosa e Verso” pela TV UCDB
(2000-2006) e do “Flores e Livros” pela UP TV e pela ORKUT TV. Pertence à
Academia Sul-Mato-Grossense de Letras, à Academia Cristã de Letras de São Paulo
e ao Pen Clube do Brasil. Diretora da União Brasileira de Escritores/Seção SP.
É palestrante, dá cursos de Pós-Graduação e oficinas literárias.
Escreveu vários livros, entre eles: Abadia (poemas, editora Imago,1996) e Casa de Tecla (poemas, editora Escrituras, 1999), finalistas do
Prêmio Jabuti de Poesia, da CBL.
Os mais recentes são o livro de ensaios Literatura e Drogas - e Outros Ensaios (Nova Razão Cultural, 2007), o de crônicas Caminhos de Bicicleta (Miró, 2010) e o de poemas Sangue Português: raízes, formação e lusofonia (Arte&Ciência, 2012). É colaboradora do Portal Top Vitrine desde abril de 2014.
Os mais recentes são o livro de ensaios Literatura e Drogas - e Outros Ensaios (Nova Razão Cultural, 2007), o de crônicas Caminhos de Bicicleta (Miró, 2010) e o de poemas Sangue Português: raízes, formação e lusofonia (Arte&Ciência, 2012). É colaboradora do Portal Top Vitrine desde abril de 2014.
HISTÓRIA DA SERRA DE MARACAJU
A Serra de Maracaju é uma serra que divide o estado do Mato Grosso do
Sul em dois, a oeste da capital, Campo Grande. A leste ficam os campos de
cerrado, enquanto se inicia, a oeste, o Pantanal sul-matogrossense. As maiores
altitudes da serra estão por volta de 750m, nas proximidades do município de
Aquidauana. A composição rochosa basicamente é formada por arenito. Esse tipo
de material também pode ser encontrado na Serra de Botucatu no estado de São
Paulo, uma vez que o município paulista compõe parte da vertente oriental da
Bacia Hidrográfica do Rio Paraná.
Entre Campo Grande e Corumbá, na BR 262, há grandes paredões de
arenito.
A composição rochosa basicamente é formada por basaltos cretáceos da
formação serra geral (antigos derrames vulcânicos). A serra pode ser
identificada como o divisor de águas entre as bacias dos Rios Paraná e
Paraguai, passando sempre pelas cotas mais altas do derrame basáltico.
No sentido Sul-Norte a serra entra no Estado de Mato Grosso do Sul
vindo do Paraguai, e passa pelos municípios de Antonio João, seguindo pela
MS-166, passa no município de Maracaju, depois segue pela BR-060 passando pelo
município de Sidrolândia, continua pela BR-060 até Campo Grande a partir daí
segue-se pela BR-163 passando por Jaraguari, Bandeirantes, pela localidade
chamada Posto São Pedro e finaliza em São Gabriel, onde já não divide mais as
duas bacias e finaliza o derrame basáltico.
Seguindo-se esse roteiro, nota-se que sempre haverá queda abrupta de
altitude no lado Oeste, na maioria das vezes mostrando as escarpas da serra, já
para o lado Leste fica o planalto. As cotas de altitude variam de 200 a 400
metros na parte de baixo da serra e de 500 a 700 na parte de cima.
No sentido Leste-Oeste a serra serve como divisor natural entre
Paraguai e Brasil Passando pelos municípios de Mundo Novo, Japorã, Sete Quedas
e Paranhos. No país vizinho ela corta cidades como Salto del Guairá, Corpus
Christi, Villa Ygatimí, YpeJhú e Itanará onde é conhecida como Sierra de
Maracayú.
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SERRA DE MARACAJU - ALMIR SATER
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FONTE:
BURCA
Raquel Naveira
(MS)
Há uma mulher por
dentro da burca,
estranha veste que
envolve o corpo
como um capuz, um
casulo,
um enorme grão.
A mulher por
dentro da burca
espia o mundo
por uma janela
quadriculada,
vê sem ser vista,
boca calada.
A mulher por
dentro da burca
busca a estrada,
a repisada trilha
dos camelos
rumo ao oásis,
mas seu caminho se
bifurca
entre o amor e a
morte.
A mulher por
dentro da burca
é vulcão.
Em suas mãos,
em sua nuca,
escorre lava
quente;
gota de fogo é o
seu coração.
A mulher por
dentro da burca
tem algo de verme,
de serpente,
de pássaro.
É feita de neblina
a sua face triste.
Por dentro da
burca
o medo sufoca,
a mulher segue a
procissão
com passos lentos,
não permaneceria
imóvel
assistindo à
procissão passar.
Por dentro da
burca
a opressão
enforca.
A mulher,
de costas viradas
ao sol,
enxerga sua
sombra.
Por dentro da
burca
a louca caminha
pela praia,
a maré alta
apagará suas pegadas.
A burca azulada
como o céu
torna a mulher
invisível.
BURQA
tradução de Neide
Barros Rêgo
Estas virino ene
de la burqa,
stranga vesto, kiu
kovras ŝian korpon,
kiel kokono
aŭ granda grajno.
Ene de tiu stranga
vesto,
tra fenestreto
kovrita per vualo,
ŝi gvatas la
mondon
vidante ne vidate
kaj dirante
nenion.
La virino ene de
la burqa
serĉas vojon
tretitan de kameloj
direkte al oazo,
sed ŝia vojo
disduiĝas
inter amo kaj
morto.
La virino ene de
la burqa
estas vulkano.
En ŝiaj manoj,
en ŝia nuko,
fluas varmega
lafo;
kaj ŝia koro estas
gut’ el fajro.
La virino ene de
la burqa
havas iom de
vermo,
de birdo,
de serpento.
Ŝia trista
vizaĝo
estas farita el
nebulo.
Ene de la burqa,
la timo ŝin
sufokas.
Ŝi akompanas la
procesion
kun lantaj paŝoj.
Ŝi ne restus senmova
spektante la
pasantan procesion.
Ene de la burqa,
la tiraneco premas
ŝian koron.
Dorse al la suno
ŝi rigardas sian
ombron.
Ene de la burqa,
ŝi fole piediras
sur la plaĝo,
kie la tajdo
forviŝos ŝiajn piedsignojn.
La ĉiela koloro de
la burqa
igas tiun virinon
nevidebla.
"Burca" de Raquel
Naveira em Português e Esperanto. Poesia enviada gentilmente pela poetisa,
diretora do Centro Cultural Maria Sabina em Niterói, Neide Barros Rêgo.
Na
oportunidade adquira a Antologia, bilíngue "POESIAS ESCOLHIDAS DO BRAZILA ESPERANTA PARNASO", o poema
encontra-se nas duas línguas: esperanto e português. Esta antologia bilíngue
foi lançada na Bienal do Livro, no Rio de Janeiro em 2007.
Os
nossos sinceros agradecimentos à poetisa Neide Barros pela sua importante
participação.
Alberto Araújo.
Alberto Araújo.
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